quinta-feira, 29 de março de 2012

Censurando o dicionário: a caminho da novilíngua da ditadura do pensamento?

O fato não está em “1984” nem se deu na Revolução Cultural de Mao Tse Tung mas aconteceu em Belo Horizonte, 2012.

O Ministério Público Federal – MPF de Belo Horizonte ajuizou pedindo a retirada de circulação do dicionário Houaiss porque conteria “expressões pejorativas e preconceituosas” contra os ciganos.

De fato, entre as múltiplas definições para a palavra, constam “aquele que trapaceia, velhaco, burlador” e “agiota, sovina”. O Houaiss marca esses usos como pejorativos.

A “Folha de S.Paulo” (02/03/2012) comenta que, nessa lógica, o MPF deveria também mandar recolher todos os dicionários que trazem, por exemplo, o termo “beócio” do qual o Aurélio registra o uso: “curto de inteligência; ignorante, boçal”. A palavra vem do fato dos atenienses acharem que os habitantes da Beócia eram camponeses ignaros.

O jornal cita também “capadócio” (natural da Capadócia, mas também ignorante, trapaceiro, canalha), “filisteu” (antigo habitante da Palestina e pessoa inculta, vulgar), “vândalo” (membro de uma tribo germânica e destruidor), além de “lapônio”, “ladino”, “safardana”, “maltês”. Também carregam alguma dose de intolerância termos como “judiar” (agir como judeu e maltratar), “cretino” (quem padece de hipotireoidismo), “escravo” (que vem de eslavo).

Não cabe ao lexicógrafo dar lições de moral ou depurar o idioma das injustiças sociais que carrega, mas tão somente registrar as acepções presentes e passadas dos vocábulos. Se não, a obra torna-se inútil, constata a “Folha”.

De fato, o País cairia numa situação tragi-comica, para dizer só isso, como a descrita em “1984” em que os agentes da “Polícia do Pensamento” corrigiam todos os dias os impressos do passado para re-escrever a História numa “novilingua” imposta pela mais radical das ditaduras.

Estariamos na antessala da pior ditadura do pensamento imaginada pelo novelista anarquista George Orwell?








Um comentário:

  1. Brilhante postagem. A newspeak vai tomar conta já na próxima geração. Note quantas palavras já têm significado inverso ou diferente para os mais jovens: animal, irado, bombado, bagatela... Isso sem falar no uso desenfreado e estratégico de milhares de expressões "não-significantes", que por serem "vazias" podem ser preenchidas com o conteúdo desejado pelo emissor: desenvolvimento sustentãvel, qualidade de vida, movimentos sociais, sociedade organizada etc.

    George Orwel (e Audous Huxley) tinham toda razão, num futuro próximo teremos uma ditadura mundial que vai controlar todas as atitudes humanas... até o pensamento...

    Seu blog é muito bom.

    Abraços e força na luta. Que Deus ilumine seu caminho!

    Ale Costa
    http://ordem-natural.blogspot.com

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